Ser Professor do 1.º Ciclo

sábado, abril 29, 2006

Continuidade vs. mobilidade docente... alguns factores a ponderar.

Um dos problemas que afecta os professores principiantes no período de indução, até pela sua condição de contratado (mas também, em muitos casos quando já pertencem aos Quadros de Zona Pedagógica), onde o vínculo à entidade empregadora é bastante precário, diz respeito à grande mobilidade docente no mesmo ano lectivo e entre anos escolares. Esta situação faz com os professores não tenham o tempo suficiente na mesma escola, com o mesmo grupo de crianças, para desenvolver um trabalho curricular e pedagógico em continuidade e profundidade.

Abro aqui uma adenda para dizer que o problema da mobilidade docente não é exclusivo dos professores em início de carreira. Como acontecia até ao presente ano lectivo (as recentes alterações nos concursos de professores vão produzir efeitos no próximo ano lectivo – ver post “avaliação”, da Paula Ribeiro), também uma larga percentagem dos professores dos Quadros de Zona Pedagógica e mesmos dos Quadros de Escola, com mais anos de serviço docente, por força da periodicidade anual dos concursos, e das figuras de mobilidade docente que eram permitidas, de um ano para o outro, entravam num processo de colocação que os fazia mudar constantemente de escola. Esta situação merecia um tratamento cuidado, pois há aqui muitas variáveis que seria necessário ponderar e explicar com detalhe, mas para este ‘post’ ficamos por esta ideia de carácter geral.

Aquilo que queria aqui ver reflectido insere-se nas questões relativas ao trabalho curricular e pedagógico que um professor realiza numa escola, contrapondo com as temáticas que cabem nas designações de mobilidade, instabilidade, continuidade docente, que podem influenciar de forma decisiva a qualidade e os resultados desse trabalho.

Assim, por questões de análise destas temáticas, e obstando uma ideia aparentemente consensual de que a continuidade docente é um factor de estabilidade profissional com repercussões na qualidade do trabalho desenvolvido pelo professor, na relação pedagógica estabelecida com o grupo de alunos, no desenvolvimento dos afectos e das relações interpessoais, no conhecimento da comunidade educativa, queria-vos chamar a atenção para outros factores que podem resultar desta análise.

A primeira questão refere-se à tendência para a rotina nos procedimentos do professor que se pode acomodar a uma situação estabilizada e pouco propiciadora de processos de investigação, colaboração, reflexão. Esta situação pode ter também implicações gravosas nas rotinas de sala de aulas, demasiado previsíveis, onde os contextos acabam por ser pouco dados à criatividade, à imaginação, à autonomia, imperando uma certa dependência de gestos, hábitos e condicionamentos.

É um facto que o professor, por muitos cuidados que tenha, acaba por estabelecer relações diferenciadas com os alunos, seja porque lhe merecem mais atenção, porque precisam de mais afecto, porque são extremamente bem educados e afáveis, ou, ao invés, são teimosos, têm dificuldades de aprendizagem, têm comportamentos agressivos ou hiperactivos, provocam ou perturbam os colegas. Também por parte dos alunos é legítimo que se compreenda que possam, por algum motivo, em muitos casos de forma não intencional, criar dificuldades de relacionamento com o professor, não se sintam à vontade com o estilo do professor, não gostem da sua maneira de ser.

Pelo facto do professor estar num contexto que não lhe agrada podemos dizer que a sua motivação não será a melhor, com prováveis repercussões no seu rendimento enquanto professor, apesar do seu carácter profissional, que o deve mover para atitudes congruentes. O professor pode não gostar de alguns colegas, pode considerar não haver condições humanas e materiais para se desenvolver um bom trabalho. Pode ainda estar longe do seu contexto familiar, do seu círculo de amizades, encontrar-se desintegrado do contexto social em que se insere a escola.

O que fazer nestes casos? Como se motiva os professores para uma função tão específica e de elevada importância quando pode haver muitos factores que a podem pôr em causa? A continuidade docente nestes casos parece não ser recomendada… Ou o sentido profissional que deve pautar a intervenção do professor resolve todas estas situações?

3 Comments:

  • Boa Noite....

    Sendo a mobilidade docente um factor condicionante do sucesso educativo, dado que inibe o desenvolvimento e a avaliação dos Projectos Curriculares e Educativos, também pode constituir uma fonte de motivação para o profissional da educação mobilizar competências no sentido da colaboração comos pares. Ou seja, por exemplo, relativamente à continuidade do trabalho, se calhar o problema resolvia-se se se realizassem reuniões específicas no início de cada ano lectivo e no fim, para se analisarem os projectos curriculares devidamente, em termos de competências, resultados, actividades desenvolvidas, princípios, em vez de ficarem arrumados no armário.

    By Blogger Nuno Monteiro, at 4/29/2006 11:37 da tarde  

  • Olá aos três primeiros participantes deste post. Queria dizer apenas que queria e continuo a querer que se discutisse as questões relacionadas com o problema da mobilidade docente, que caracteriza muito a actividade profissional do 1CEB, bem como, as ditas vantagens para todos os intervenientes na escola da dita continuidade docente. Estas questões tornam-se ainda mais pertinentes, se assim se pode dizer, tendo em conta o facto de os procedimentos dos concursos de professores preverem, a partir do próximo ano lectivo, a fixação dos professores para 3/4 anos na mesma escola.

    A forma como propus este desafio acabou por ser diferente, tentando chamar a atenção para aspectos que normalmente não são ponderados nesta discussão, o que se pode interpretar como uma provocação. A maneira como podem corresponder a este desafio pode, assim, ser diversa:
    - pode ser pelas vantagens da continuidade/estabilidade docente;
    - pelos problemas da mobilidade docente;
    - pelos eventuais ‘perigos’ da estabilidade profissional, que pode levar a um certo ‘funcionalismo público’ dito ‘rotineiro’ e ‘acomodado’;
    - ainda pelo carácter compulsivo da continuidade docente num determinado contexto que é atribuído pela ‘arbitrariedade’ dos concursos (não há uma escolha explícita da escola em função das suas características organizativas, estruturais, pedagógicas, ou outras).

    By Blogger Carlos Silva, at 5/02/2006 11:03 da manhã  

  • Olá, Paula.
    Entendo, sobretudo, a entrega e a dedicação aos 'seus' alunos (o sentido de posse, para os professores, é muito forte) em situações de estabilidade profissional, pois os resultados tornam-se mais evidentes e são directamente correlacionados com o trabalho sistematizado que pode ser desenvolvido sem grandes sobressaltos, como são as mudanças constantes de professores.
    Percebo a questão da responsabilização, mas ainda assim entendo que o sentido profissional deve imperar, apesar das circunstâncias, em muitos casos, não serem as mais favoráveis. Claro que isso tem implicações na motivação dos professores e tudo que se possa fazer para melhorar essas condições será sempre positivo, como será o caso da estabilidade profissional. Agora, como se consegue isso? ...

    By Blogger Carlos Silva, at 5/04/2006 9:56 da manhã  

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